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Este blog assume a forma de um instrumento de reflexão e de avaliação, inserindo-se na Unidade Curricular RI-AICE, orientada pela professora Luísa Aires, no âmbito do Mestrado de Supervisão Pedagógica, ministrado pela Universidade Aberta.



Tema 3

Agentes, intencionalidades e contextos educativos: uma abordagem dialógica das interacções
 

Sinopse
Exigências da 'Nova Escola'
A escola surge, cada vez mais, como um espaço de encontro de desigualdades sociais, económicas, culturais, étnicas, religiosas. Este aspecto reclama a presença do professor tutor, que tem  como missão ajudar os alunos a integrarem-se, factor determinante para o seu sucesso escolar.
 
 
Apresentação das tarefas propostas e respectivos objectivos
As tarefas propostas são duas:
1.ª Análise dos textos propostos em fórum pela professora;
2.ª Discussão fundamentada dos materiais trabalhados.
Os objectivos são:
- Explorar a abordagem dialógica das interacções privilegiando a dialéctica entre os Agentes, Intencionalidades e Contextos;
- Analisar planos de interacção particulares, em âmbito educativo, como é o caso da acção tutorial.




A Pedagogia Construtivista de Lev Vygotsky
1. Conhecendo Vygotsky…a sua biografia

O psicólogo Lev Semenovitch Vygotsky nasceu em 1896, em Orsha, uma pequena cidade perto de Minsk, a capital da Bielo-Rússia, região então dominada pela Rússia (e que só se tornou independente em 1991, com a desintegração da União Soviética, adotando o nome de Belarus). Os seus pais eram de uma família judaica culta e com boas condições económicas, o que permitiu a Vygotsky uma formação sólida desde criança. Ele teve um tutor particular até entrar no ensino secundário e, desde cedo, interessou-se por ler. Aos 18 anos, matriculou-se no curso de medicina em Moscovo, mas acabou por frequentar a faculdade de direito. Formado, voltou a Gomel, na Bielo-Rússia, em 1917, ano da revolução bolchevique, que ele apoiou. Leccionou literatura, estética e história da arte e fundou um laboratório de psicologia, área em que rapidamente ganhou destaque, graças à sua cultura enciclopédica, ao seu pensamento inovador e à sua intensa actividade, tendo produzido mais de 200 trabalhos científicos. Em 1925, já sofrendo da tuberculose que o mataria em 1934, publicou “A Psicologia da Arte”, um estudo sobre Hamlet, de William Shakespeare, cuja origem é sua tese de mestrado.
Em menos de 38 anos de vida, Vygotsky conheceu momentos políticos drasticamente diferentes, que tiveram forte influência no seu trabalho. Nascido sob o regime dos czares russos, Vygotsky acompanhou de perto, como estudante e intelectual, os acontecimentos que levaram à revolução comunista de 1917. O período que se seguiu foi marcado, entre outras coisas, por um clima de efervescência intelectual, com a abertura de espaço para as vanguardas artísticas e o pensamento inovador nas ciências, além de uma preocupação em promover políticas educacionais eficazes e abrangentes. Logo após a revolução, Vygotsky intensificou seus estudos sobre psicologia. Visitou comunidades rurais, onde pesquisou a relação entre o nível de escolaridade e o conhecimento, e a influência das tradições no desenvolvimento cognitivo. Com a ascensão ao poder de Josef Stalin, em 1924, o ambiente cultural ficou cada vez mais limitado. Vygotsky usou a dialéctica marxista para a sua teoria de aprendizagem, mas a sua análise da importância da esfera social no desenvolvimento intelectual era criticada por não se basear na luta de classes, como se tornara obrigatório na produção científica soviética. Em 1936, dois anos após a sua morte, toda a obra de Vygotsky foi censurada pela ditadura de Stalin e assim permaneceu por 20 anos.
A primeira publicação das obras de Vygotsky ocorreu na era Krutchov. E foi a tradução do seu livro "Pensamento e Linguagem", que acabaria por o tornar conhecido no Ocidente. Nos inícios da década de 90, Vygotsky tornou-se uma figura conhecida nas universidades de todo o mundo.




2. “O caminho do objecto até à criança e desta até ao objecto passa por outra pessoa”
A parte mais conhecida da extensa obra produzida por Vygotsky converge para o tema da criação da cultura, sendo que aos professores ou aos outros profissionais da área da educação interessam, sobretudo, os estudos sobre o desenvolvimento intelectual. Vygotsky atribuía um papel preponderante às relações sociais neste processo, colocando, deste modo, a ênfase no social, em oposição ao biólogo suíço Jean Piaget (1896-1980), que também se dedicou ao tema da evolução da capacidade de aquisição de conhecimento pelo ser humano, mas que atribuía mais importância aos processos internos do que aos interpessoais nesta evolução.
2.1. O papel do adulto
Toda a aprendizagem, segundo Vygotsky, é mediada, ou seja, o primeiro contacto da criança com novas actividades, habilidades ou informações deve ter a participação de um adulto. Assim, o papel do ensino e do professor é mais activo e determinante do que o previsto por Piaget e outros pensadores da educação, que consideravam que cabe à escola facilitar um processo que só pode ser conduzido pelo próprio aluno.

3. Zona de Desenvolvimento Proximal






O ensino, para Vygotsky, deve antecipar-se ao que o aluno ainda não sabe nem é capaz de aprender sozinho, porque, na relação entre aluno e desenvolvimento, o aluno vem primeiro. É a isso que se refere um dos seus principais conceitos, o de Zona de Desenvolvimento Proximal ou ZDP, que pode ser definido como a distância entre o nível de resolução de um problema ou tarefa que uma criança pode alcançar actuando independentemente e o nível que pode alcançar com a ajuda de outra pessoa mais competente ou mais experiente nessa tarefa. Em outras palavras, a ZDP é o caminho entre o que a criança consegue fazer sozinha e o que ela está perto de conseguir fazer sozinha. Saber identificar essas duas capacidades e trabalhar o percurso de cada aluno entre ambas, são as duas principais habilidades que um professor precisa ter, segundo Vygotsky. Deste modo, na formação do conhecimento desempenha um papel primordial a instituição escolar, considerando que é graças à intervenção pedagógica que se podem observar avanços ao nível da aprendizagem, que de outro modo não aconteceria.
Vygotsky considera que o bom ensino é aquele que estimula a criança a atingir um nível de compreensão e habilidade que ainda não domina completamente, dado que "Ensinar o que a criança já sabe desmotiva o aluno e ir além de sua capacidade é inútil".
Assim, quando o professor prepara actividades ou define estratégias, deve atender ao nível de desenvolvimento real do aluno, ou seja, ao nível segundo o qual este terá capacidade de resolver sozinho os problemas colocados, de modo a identificar possíveis dificuldades de aprendizagem. Só assim se poderá falar em desenvolvimento cognitivo, pois se a tarefa se apresentar muito fácil, será pouco estimulante, não levando ao desenvolvimento; mas se for muito difícil, também não ocorrerá aprendizagem, dado que se encontra fora da ZDP.
Logo, ao nível do contexto educativo, torna-se necessário adequar as experiências de aprendizagem aos alunos, tendo sempre em atenção verificar se cada um em particular tem aptidão para desenvolver a sua ZDP, dado que só em casos de grandes e profundas dificuldades cognitivas é que isto poderá não ser possível. Neste sentido, todos os sujeitos podem desenvolver a sua ZDP, dado que esta não é mensurável. No entanto, este desenvolvimento, em termos temporais, varia de indivíduo para indivíduo, tendo as actividades de ser adequadas ao perfil de cada um.
Este aspecto é observável em várias situações de aprendizagem, mesmo em bebés: o andar, o falar… Nem todas as crianças as adquirem na mesma fase etária e o ritmo em que as desenvolvem é diferente, ou seja, apresentam ritmos de aprendizagem diferenciados.
Outro aspecto que há a considerar prende-se com a performance de apropriação de ferramentas, que poderá variar consoante ocorram alterações ao nível do desenvolvimento cognitivo ou dos contextos modificados.
No meu caso particular, posso referir que tendo duas filhas, verifico que a minha filha mais nova de três anos está mais desenvolvida que a minha mais velha quando tinha esta idade. Este aspecto encontra-se relacionado com o facto de copiar muito as atitudes da irmã, o ter, no fundo, um exemplo e também por ter que se ‘desenrascar’ sozinha, dado que o tempo que lhe dedico é muito menor comparado com aquele que dedicava à irmã quando tinha a mesma idade.

4. Teoria da Actividade
O processo de ensino e aprendizagem analisado através da Teoria da Actividade consiste na concretização de uma série de actividades que permitirão ao aluno adquirir o saber e competências desejadas e tornar-se, desse modo, o resultado da sua própria actividade, sempre condicionado pelos contextos e objectivos. Neste sentido, a aprendizagem aparece dependente do ‘querer’ que é, por sua vez, condicionado pelos diferentes contextos que envolvem o aluno.
Para Vygotsky, a consciência humana tem dupla natureza: social e cultural. Sociedade e cultura são, assim, conceitos criados pela necessidade organizativa inata ao Homem que os cria para depois se regular por eles. Neste sentido, interiorização é o processo pelo qual o sujeito modifica os artefactos culturais apropriados em condicionantes transformadores da mente e os utiliza numa perspectiva intrapessoal, consciente ou inconscientemente.
4.1.Teoria da Actividade em Contexto Escolar
Fernandes (2009) considera que o local de aprendizagem é um “sistema de actividade” (p. 91), sendo neste espaço físico que o professor orienta os alunos para a aquisição de saberes e competências, que a dúvida se confronta com a certeza, que a curiosidade motiva a descoberta, que a falta de competências dá lugar ao desânimo, tudo num processo activo, interactivo, de avanços e retrocessos. Assim, cabe ao professor a capacidade de adequar as actividades aos seus alunos de modo a que eles consigam reconhecer os sinais, os códigos, as linguagens daquilo que se pretende transmitir como bom e útil para o seu desenvolvimento, bem como contribuir para a aquisição/construção de novas ferramentas que irão valorizar a sua interacção social e cultural.

5. Tutoria em Vygotsky
Segundo Vygostky, uma pedagogia eficaz não deve resumir-se a um processo de ensino e aprendizagem baseado na interiorização, dado que o aluno deverá ser capaz de reconhecer e usar os saberes em novas situações. Assim, surge o conceito de professor tutor que, através de uma função de regulador das aprendizagens, orienta, de forma subtil, as actividades do aluno que, deste modo, se torna mais confiante na resolução dos problemas. A tutoria pode, ainda, ser feita pelos pares, ou seja, entre os alunos.
5.1. Orientação em Interacção
As interacções sociais podem ser simétricas ou assimétricas. Nas interacções assimétricas os sujeitos assumem papéis diferentes, sendo neste tipo de interacções que se enquadram as tutorias, dado que se baseiam em mediações e interacções assimétricas entre sujeitos, as quais possibilitam orientar, dirigir e supervisionar o processo de aprendizagem.
Deste modo, o professor tutor, acompanhando de forma mais individualizada o aluno e estabelecendo contactos regulares com a família, terá mais condições para definir a ZDP deste, já que poderá alcançar sobre o mesmo uma visão sistémica, composta dos vários sistemas de relações em que o aluno emerge como objecto a desenvolver.
5.2. O tutor
A figura do tutor está consignada no Decreto Regulamentar 10/99 de 21 de Julho, que complementa o Decreto-lei n.º 75/2008, de 22 de Abril, art.º 44, artigo 10.º, remetendo para o Regulamento Interno dos Estabelecimentos de Ensino a definição de outras competências consideradas pertinentes em cada contexto educativo.
O professor tutor deverá ter o seguinte perfil:
- ser docente profissionalizado com experiência adequada; ter facilidade em relacionar-se, nomeadamente com os alunos e respectivas famílias; ter capacidade de perceber os objectivos dos alunos e das suas famílias e estabelecer uma ligação real e adequada com a escola e tudo o que ela tem e pode oferecer, de modo a preencher as expectativas que aqueles possam ter; ter capacidade de negociar e mediar em diferentes situações e conflitos; ter capacidade de trabalhar em equipa; ser coerente, flexível e persistente; conhecer em profundidade o nível de escolaridade do grupo de alunos; ter capacidade para proporcionar experiências enriquecedoras e gratificantes para os alunos; comprometer os alunos e fazê-los participar na definição de objectivos, tornando-os ainda responsáveis; fomentar um ensino participativo, de forma a desenvolver nos alunos o sentimento de serem agentes da sua aprendizagem; criar um clima de interacção em que os alunos se sintam livres para se expressarem; e criar pontes com a comunidade enquadrando, se necessário, apoio externo.
5.2.1. Funções do professor tutor
As funções do professor tutor são acompanhar de forma individualizada o processo educativo de um grupo restrito de alunos, de preferência ao longo do seu percurso escolar; elaborar um plano de acção tutorial; facilitar a integração dos alunos na escola e na turma; contribuir para o sucesso educativo e para a diminuição do abandono escolar; aconselhar e orientar no estudo e nas tarefas escolares; atender às dificuldades de aprendizagem dos alunos para propor, sempre que necessário, adaptações curriculares, em colaboração com os professores e os serviços especializados de apoio educativo e fazer a sua coordenação; promover a articulação das actividades escolares dos alunos com outras actividades formativas; esclarecer os alunos sobre o mundo laboral e os procedimentos de acesso ao mesmo, promovendo atitudes de empreendedorismo; esclarecer os alunos sobre as suas possibilidades educativas e os percursos de educação e formação disponíveis; ensinar os alunos a expressarem-se, a definir objectivos pessoais, a auto-avaliarem-se de forma realista e a serem capazes de valorizar e elogiar os outros; trabalhar de modo mais directo e personalizado com os alunos que manifestam um baixo nível de auto-estima ou dificuldade em atingirem os objectivos definidos; obter um conhecimento profundo dos alunos e dos contextos em que se inserem; facilitar a cooperação educativa entre os docentes da(s) turma(s) e os pais/encarregados de educação dos alunos; implicar os docentes das disciplinas em que os alunos revelam maiores dificuldades em actividades de apoio à recuperação; implicar os pais/encarregados de educação em actividades de controlo do trabalho escolar e de integração e orientação dos seus educandos; informar, sempre que solicitado, os pais/encarregados de educação, o Conselho de Turma e os alunos sobre as actividades; desenvolver a acção de tutoria de forma articulada, quer com a família, quer com os serviços especializados de apoio educativo; e elaborar relatórios periódicos.
Assim, o papel do tutor prende-se com o facilitar ao aluno um trabalho em autonomia, criativo e de experiência afectiva. Por outro lado, deve reduzir a ansiedade e o mal-estar que conduz, muitas vezes, ao abandono da escola e desistência do plano de estudos. Por fim, todo este trabalho deve ser feito com inteira confidencialidade, precavendo a exposição do aluno.


Reflexão sobre a pertinência científica e pedgógica do tema
A tutoria, entendida como processo de aconselhamento, auxílio e orientação, tem como principal função equilibrar as potencialidades do aluno com as ofertas educativas, visando, deste modo, contribuir para o seu desenvolvimento pessoal e êxito académico.
Deste modo, a tutoria e o professor tutor são cada vez mais uma necessidade nas escolas, tornando-se crucial que o trabalho com tutorias se torne uma prática comum.


Trabalhos realizados no âmbito do tema
Estando a leccionar no 1.º Ciclo do Ensino Básico, despertou-me atenção, na pesquisa que fiz, um estudo realizado por Ana Cristina Monteiro Carvalhal, em 2009, no âmbito de uma dissertação de mestrado em Ciências da Educação, que tinha como principal objectivo analisar as representações sociais de professores do 1.º Ciclo do Ensino Básico, da cidade de Aveiro, face ao Estudo Acompanhado que leccionam, sendo aqui o Estudo Acompanhado encarado como uma via tutorial.  


http://biblioteca.sinbad.ua.pt/teses/2010000578


Também gostaria de destacar um artigo de Débora Barbosa da Silva Sanchez, sobre tutoria, que refere um estudo realizado pela autora que teve como principal objectivo implementar uma tutoria de modo a fomentar situações que propiciassem a aprendizagem.



http://www.revista.inf.br/pedagogia04/pages/artigos/artigo05.htm


 

Fontes:
Fernandes, D. (2009). Avaliação das aprendizagens em Portugal: investigação e teoria da actividade. Sísifo. Revista de Ciências da Educação, o9, 87-100.

Karcher, M. (2008): The study of mentoring in the learning environment (SMILE). A randomized evaluation of the effectiveness of school-based mentoring. Prevention Science, 9 (2), 99-113.


http://homosovieticus.blogs.sapo.pt/arquivo/427493.html